... Quando ouço aquela ladainha entoada pelos pedantes especializados em protestinhos baratos, penso se, ao invés do futebol, não sejam certas doutrinas e filosofias caducas os verdadeiros ópios que põem o povo em torpor.
NO FIO DA NAVALHA
SEMEANDO A DÚVIDA
domingo, 18 de dezembro de 2011
TRAGÉDIA DO POVO
... Quando ouço aquela ladainha entoada pelos pedantes especializados em protestinhos baratos, penso se, ao invés do futebol, não sejam certas doutrinas e filosofias caducas os verdadeiros ópios que põem o povo em torpor.
domingo, 20 de março de 2011
DISFARCES
quinta-feira, 4 de novembro de 2010
CETICISMO CONTEMPORÂNEO
Há uma diferença fundamental entre o ceticismo contemporâneo e aquele outro ceticismo nascido e desenvolvido com a modernidade. Tributária do racionalismo grego clássico, a postura cética consolidada com as revoluções burguesas pôs em suspeição e descrédito somente as matrizes explicativas dominantes da época, ou seja, a fé e a religião. Tomadas como obscuras formas de conhecimento, elas foram vistas apenas como produtoras de crendices e superstições, as quais careciam de análises comprobatórias e conduziam ilusões e erros. Para os céticos racionalistas, somente o saber racional – único confiável – poderia atingir a verdade e, através da manipulação e controle da realidade, levar o homem ao caminho do bem ou, nas palavras da época, ao progresso. Tratava-se de um movimento que, supondo a exclusão entre fé e racionalidade, matou de maneira impiedosa o fantasioso Deus para pôr em seu trono a iluminadora, soberana e, agora, legitima doadora de sentido pra vida humana, razão. Tal ceticismo foi ficcionalizado por Ivan Turgueniev, em seu romance Pais e Filhos, no personagem Bazarov – homem utilitarista, devotado à ciência, particularmente à biologia, desprezador das vãs convenções aristocráticas e das tolas crenças do povo, além de negador do valor da arte e do amor, mesmo tendo sucumbido ao seu poder. Mais radical e extremo, o ceticismo do que se convencionou chamar de pós-modernidade, por sua vez, não limita a suspensão do seu juízo à fé e à religião. Sua descrença, muito mais ampla que a dos homens das Luzes, atinge também a até então divinizada razão. Aos olhos dos céticos contemporâneos, o conhecimento racional se revelou falível em sua ambição de verdade, uma vez que ele é parcial, concebido a partir de uma perspectiva limitada, e, ao mesmo tempo, se mostrou incapaz de gerar o idealizado progresso, trazendo, ao contrário, uma série de desastres – monstros que a razão, mesmo desperta, e não apenas adormecida como no quadro de Goya, foi capaz de conceber (duas guerras mundiais, holocausto, totalitarismos, bombas atômicas, degradação ambiental, etc.). Em uma era de verdades destroçadas e utopias mortas emerge, assim, uma espécie de ceticismo iconoclasta, irracionalista, obscurantista, um niilismo absoluto que dilui a diferença entre fé e racionalidade afirmando sua equivalência, uma incredulidade tal que, mal terminado o sepultamento de Deus, tratou de assassinar aquela que foi posta em seu lugar. O filósofo romeno Emil Cioran talvez seja maior expressão dessa nova postura. Chamado de a hiena pessimista, esse pensador desenganado, para quem “a lucidez completa é o nada”, desmistificou tanto a fé como a razão, vendo ambas como delírios desprovido de objetividade, produzidos pela sede Absoluto inerente ao homem. Entre o oitocentista Bazarov e o contemporâneo Cioran, entre o ceticismo moderno e o atual, há, portanto, uma distância irredutível: enquanto para os primeiros havia um porto seguro onde ancorar a existência, para os outros, a vida repousa sobre nada. Pois se os modernos encontraram uma substituta para a fé, os pós-modernos ainda não encontraram para a razão. O trono da dinastia dos Absolutos encontra-se vago.
* A gravura acima – O sono da razão produz monstros – é do espanhol Francisco de Goya.